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Reportagem feita por Sandra Machado em que o pesquisador Christoph Türcke discorre sobre a relação existente entre as novas tecnologias e o TDAH.
Um olhar diferenciado sobre o TDAH
Escrito por Sandra Machado
Publicado em 31 de março de 2015
Pesquisador de referência nas discussões sobre o Transtorno do Déficit de Atenção/Hiperatividade (TDAH) na Europa, Christoph Türcke é professor da Escola de Artes Visuais da Universidade de Leipzig, na Alemanha, e atuou como professor visitante na Universidade Federal do Rio Grande do Sul no início dos anos 1990. Autor do best-seller Hiperativo! Crítica da Cultura do Déficit de Atenção, ainda não publicado no Brasil, Türcke desmistifica a chamada "habilidade multitarefa", frequentemente associada à dispersão. Seu maior diferencial na abordagem de um tema tão controverso é que o filósofo entende o TDAH como um fenômeno coletivo. Para ele, o principal fator de desequilíbrio está na forma como lidamos com um movimento ascendente de importância atribuída às novas tecnologias de informação e de comunicação. Estes e outros temas são abordados na entrevista a seguir.
MultiRio – Qual o papel dos dispositivos eletrônicos, como smartphones e celulares, dos quais as pessoas têm se tornado cada vez mais dependentes?
Christoph Türcke – A miniaturização dos aparelhos eletrônicos, como smartphones e celulares, vem facilitando sua incorporação, não apenas ao nosso cotidiano, mas também ao corpo humano. Já se tornou um reflexo condicionado estar sempre checando a entrada de uma nova mensagem, ou estar enviando uma mensagem para alguém, pelo smartphone ou pelo celular – ainda que se esteja em meio a uma conversa presencial. Tanta dependência potencializa como que um déficit de atenção generalizado. O que, na atualidade, parece normal, alguns anos atrás seria considerado patológico.
M – O TDAH pode ser considerado uma enfermidade?
CT – Para psiquiatras europeus, o TDAH só pode ser considerado uma enfermidade quando o paciente em questão, supostamente, vive em um ambiente saudável. As crianças com TDAH sofrem de uma espécie de mau contato, quase imperceptível, no cérebro. Então, são medicadas com metilfenidato (Ritalina), uma substância que, na Alemanha, se submete à normatização na categoria dos psicotrópicos. Às vezes as crianças ficam mais calmas com o medicamento, mas elas não ficam curadas. Assim que a droga é retirada, há um retorno ao quadro anterior. Acontece que, desde muito cedo, ainda na fase de amamentação, muitas delas estão cercadas por um entorno no qual predomina o déficit de atenção, e elas são mais vulneráveis a estas influências. Jovens e adultos também não são imunes e é por isso que o TDAH, há muito tempo, deixou de ser um fenômeno próprio da infância.
M – A capacidade de pensar fica prejudicada quando se é permanentemente solicitado a dar conta de múltiplas tarefas ao mesmo tempo?
CT – Há 50 anos, já era possível dirigir e conversar ao mesmo tempo, ou fazer algum trabalho manual enquanto se ouvia o rádio. Mas isso só funciona porque uma das atividades é essencialmente mecânica. O que os jovens fazem hoje não é mais do que interromper cada uma das atividades – resolver o dever de matemática, aprender uma língua estrangeira ouvindo um áudio pelo headphone e navegar no Facebook – a intervalos curtos. É claro que, na verdade, eles não dão conta disso simultaneamente. Estão só mais bem treinados a forçar sua atenção a saltos entre uma tarefa e outra. Dá menos trabalho para eles do que para os idosos, pelo menos enquanto não tiverem envelhecido. Ainda não existem nativos digitais na faixa dos 60 anos. Aí, sim, vamos ver o que acontece.
M – Existe alguma consequência política deste fenômeno?
CT – Questiono em que sentido a execução paralela de tarefas poderia ser considerada mais eficiente do que a sequencial. O pensamento multitarefa não apenas fica diferente, mas também mais superficial e volátil, gerando, portanto, consequências desastrosas sob o ponto de vista da vida política.
M – O senhor faz referência aos chamados "rituais de atenção", que seriam capazes de minimizar o TDAH em crianças – poderia explicar melhor do que se trata?
CT – Defendo uma volta à tradição das repetições institucionalizadas e facilitadoras no exercício de sedimentar a informação recebida. A partir do momento em que os rituais se naturalizam no cotidiano, servem como pausa e como orientação. Crianças que aprendem a acompanhar a narração de um conto, a cantar uma canção com várias estrofes, a recitar um texto decorado ou a escrever à mão, desenvolvem um sentido de correlação, de continuidade. O melhor tranquilizante que existe está no aconchego de ter alguém para contar ou ler para elas uma historinha na hora de dormir.
M – Qual sua opinião sobre tratar TDAH com medicamentos e/ou terapia?
CT – Ocasionalmente, os adultos apelam para a medicalização no tratamento do TDAH em crianças. Creio que uma droga deve ser administrada apenas em último caso, e sempre acompanhada por psicoterapia individual. O que entendo como condenável, no entanto, é que os filhos sejam conduzidos aos cuidados de um psiquiatra ou de um psicoterapeuta como se estivessem sendo "levados para o conserto", sem que os pais ou responsáveis ao menos tentem rever sua própria conduta. Frequentemente, um padrão familiar equivocado se torna um terreno fértil para o desenvolvimento do TDAH infantil.
M – O senhor pode recomendar, aos pais e professores, algum método para ajudá-los a lidar com as crianças que têm TDAH?
CT – O mais importante antídoto contra o transtorno continua sendo um dia a dia bem estruturado, com indicações claras sobre a rotina da criança – o que inclui, por exemplo, a regularidade de horários para o estudo, a brincadeira e a alimentação. No entanto, na maioria dos casos de TDAH, nem os pais, nem a escola têm sido capazes de garantir essa base nos anos primordiais de formação da personalidade. A verdadeira doença é o estado atual da sociedade, ou seja, a "cultura do déficit de atenção". Ela é um fenômeno global. As crianças com TDAH são apenas os protagonistas desta cultura. Elas espelham a própria sociedade.
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